Resumo
O artigo tem como objetivo refletir sobre o reconhecimento pessoal como uma forma de evitar condenações injustas, analisando julgados dos tribunais superiores e a Psicologia do Testemunho. O problema de pesquisa reside na desconexão entre as diretrizes do artigo 226 do Código de Processo Penal e a prática policial, que frequentemente ignora essas orientações, resultando em processamento de inocentes. A metodologia adotada é dedutiva e exploratória, utilizando fontes doutrinárias como artigos, livros e jurisprudências. Os principais resultados destacam a falibilidade da memória humana, que pode ser distorcida por sugestões externas, causando erros judiciais. O estudo alerta para os riscos de reconhecimentos inadequados e enfatiza a necessidade de elementos independentes para embasar condenações. Como contribuição, o artigo sugere que as corporações policiais revisem suas rotinas, implementando procedimentos mais rigorosos para garantir a qualidade dos relatos e reconhecimentos.
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BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Habeas Corpus nº 598.886/SC. Habeas Corpus. Roubo majorado. Reconhecimento fotográfico de pessoa. Realizado na fase do inquérito policial. Inobservância do procedimento previsto no art. 226 do CPP. Prova inválida como
Fundamento para a condenação. Rigor probatório. Necessidade para evitar erros judiciários. Participação de menor importância. Não ocorrência. Ordem parcialmente concedida. Relator: Ministro Rogerio Schietti Cruz, 27 de outubro de 2020. Disponível em: https://processo.stj.jus.br/processo/pesquisa/?termo=HC+598886&aplicacao=processos.ea&tipoPesquisa=tipoPesquisaGenerica&chkordem=DESC&chkMorto=MORTO. Acesso em: 27 out. 2024.
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